quinta-feira, 23 de abril de 2020

A invenção do pedágio

Cosme e Damião, monges de um mosteiro das redondezas, vinham trotando
em suas mulinhas de volta para casa, após venderem na feirinha da
aldeia os produtos que trouxeram da horta e do pomar que cultivavam
nas dependências do monastério.

Ao chegarem à entrada da ponte sobre o rio Chuá, foram barrados por
dois sujeitos mal-encarados e um deles lhes disse:

- Onde pensam que vão, padrecos?

- Não somos padres, somos monges. - disse o monge Cosme.

- Vamos retornar ao convento, irmão. - respondeu o monge Damião.

- Sei! Para voltarem ao convento terão que passar sobre essa ponte, não
é?

- Claro, irmão, afinal, este é o caminho. - disse Damião.

- Sei! Mas para passarem pela ponte terão que pagar o pedágio.

- Como? Esta ponte foi mandada construir pelo Príncipe de Estória, Sir
Blind, Senhor das terras de Estória. - disse o monge Cosme.

- E tem mais: Essa bandalheira de pedágio é coisa do futuro bem
distante, segundo li nas cartas do tarô. - completou o monge Damião.

- Mas acabamos de inventar. Certamente esse povo do futuro nos copiou!
E fizeram muito bem... pros bolsos deles! Rê rê rê rê!

- Está bem, irmão. Quantas moedas temos que pagar? - perguntou Cosme.

- Depende de quantas moedas vocês trazem.

- Irmão Damião, veja quantas moedas temos e quantas poderemos dar a
esses... senhores. - disse o monge Cosme.

O monge Damião pegou a bolsinha com as moedas, mas antes que a abrisse,
o bandido a puxou da sua mão.

- Vocês não podem ficar com todas essas moedas, irmãos. Elas servirão
para comprarmos mantimentos para o mosteiro.

- Serviriam, padrecos, mas agora são nossas. Podem atravessar a ponte.
Rê rê rê rê!

Desgostosos por não terem como fazer nada, os monges atravessaram a
ponte e meia hora depois adentravam os portões do convento com os
caçuás das suas mulinhas vazios e sem as moedas.

O Abade e alguns monges estavam na copa conversando com o mago Manblind
e seu escudeiro e amigo Loubrail quando Cosme e Damião contaram o
ocorrido. O Abade ficou triste porque naquela semana certamente
passariam necessidade, mas agradeceu a Deus porque os monges não
sofreram agressão.
Manblind, vendo a situação, disse ao Abade:

- Abade, eu e o Loubrail iremos recuperar suas moedas.

- Não, irmãos. Esses homens malvados podem ser perigosos!

- Eu também sei ser perigoso, Abade. Não se preocupe, sairemos agora
mesmo. Loubrail, prepare nossos cavalos.

Dez minutos depois Loubrail estava com os cavalos arreados à espera de
Manblind. Eles montaram e partiram.

Cerca de meia hora estavam diante da ponte e quando se preparavam para
atravessá-la, os dois bandidos os pararam:

- Onde pensam que vão os senhores?

- Vamos à aldeia de Dalei, por quê? - perguntou Manblind.

- Porque para passarem nessa ponte têm que pagar o pedágio.

- Mas a ponte não é de vocês, segundo sei.

- Mas agora é nossa e se quiser passar, vá logo desembolsando suas
moedas.

- Quantas moedas temos que lhes dar, cavaleiro?

- Depende de quantas moedas tragam nesse alforge aí.

- Loubrail, veja quantas moedas podemos dar a estes senhores, por
favor.

Quando Loubrail retirou o alforge da cela e ia olhar seu conteúdo, o
ladrão arrebatou a bolsa e, com um sorriso mau, abriu o alforge e meteu
a mão lá dentro.
Sem que os meliantes percebessem, Manblind fez um gesto com as mãos.

O homem soltou um grito terrível e retirou a mão. Um pequeno dragão
alado mordia seus dedos. A outro gesto do mago, outro dragão saiu
voando da bolsa e foi morder a garganta do segundo facínora.
O primeiro dragão largou os dedos do cara e pulou em sua garganta.
Logo os dois homens estavam mortos.
Manblind ordenou que os dragões ficassem quietos e mandou que Loubrail
pegasse todas as moedas que os homens tivessem em seus bolsos e a
bolsinha dos monges. Assim que Loubrail voltou a montar em seu cavalo,
Manblind fez mais um gesto e os dragões ficaram enormes e começaram a
devorar os corpos dos homens. O mago ordenou às feras que fizessem a
festa e desaparecessem.

Quando Manblind e Loubrail já haviam cavalgado cerca de uma légua, os
dragões desapareciam no horizonte.

Finalmente nossos heróis chegavam ao mosteiro, entregavam o que
retiraram dos bandidos, entregavam ao Abade e se retiraram para curtir
uma merecida sesta.


- FIM -
Luís Campos (Blind Joker)
Salvador, 25 de janeiro de 2020

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